A Descoberta Tardia: Minha Vida Com Asperger

Desde criança, eu sempre me senti como um peixe fora d’água. Nos momentos de brincadeiras, eu era a menina que preferia desenhar os padrões da areia a construir castelos. As outras crianças pareciam saber dançar uma música que eu não podia ouvir. 

Adolescência foi como entrar numa ópera sem entender uma palavra de italiano, todos à minha volta desabrochavam em amizades e romances, enquanto eu me perdia em livros e teorias, fascinada por estrelas e insetos.

Adultice chegou com seus desafios; encontrei no trabalho um refúgio onde regras e rotinas faziam sentido, mas os ‘happy hours’ eram um labirinto sem mapa. Ser mãe foi a virada de jogo, quando o amor me ensinou a falar a língua do coração, ainda que tropeçando nas palavras sociais.

Quando descobri que tinha Asperger, foi como ganhar um manual para uma máquina que operava no instinto por décadas. Aprendi a navegar na minha mente como uma espiã, sorrindo nos momentos certos, memorizando frases para café e comentários sobre o tempo, enquanto mantinha meu mundo de sonhos e análises bem guardado.

Hoje, quero ser a farol que eu não tive, guiando outros que se sentem náufragos em um oceano de olhares e expectativas. Com humor, digo que somos todos extraterrestres em um planeta de normas não escritas, procurando nosso pequeno canto no universo para chamar de lar.

Lembro de uma vez, quando perdi o ponto de ônibus porque estava absorta na beleza simétrica das árvores – as pessoas riram, mas eu só pensei: “Que espetáculo eu teria perdido, se fosse ‘normal’”. Assim, entre risos e estranhezas, vou desbravando esse mundo, um passo desajeitado de cada vez.

A história continua, claro, mas agora é menos sobre descobertas internas e mais sobre a troca com o mundo. 

Cada conversa com meus filhos adultos, cada encontro com outros pais e mães, é uma chance de espalhar compreensão e aceitação. Compartilho minhas histórias – como quando organizei todos os produtos da geladeira por cor, ou a vez que confundi uma expressão idiomática e levei ao pé da letra, causando risos por semanas.

Agora, vejo cada traço de Asperger não como uma barreira, mas como um traço de minha individualidade. E assim, sigo com a missão de mostrar que o espectro é amplo e belo, e que ‘normal’ é apenas uma configuração de fábrica em um mundo que pede personalização. 

Continuo a jornada, agora mais mestre do que aprendiz, sempre pronta para uma boa risada sobre os deslizes que apenas enriquecem a tapeçaria da vida.

Artigos Relacionados

Respostas